Um mês após o assassinato brutal de três mulheres na Praia dos Milionários, em Ilhéus, a investigação segue marcada por lacunas. Apesar da confissão de Thierry Lima da Silva, 23 anos, preso dias após o crime, exames de DNA não encontraram vestígios dele nos corpos das vítimas nem nas três facas analisadas como possíveis armas utilizadas no ataque. A informação foi revelada em reportagem exclusiva do Correio, assinada pelo jornalista Bruno Wendel.
O caso, que chocou a cidade turística e ganhou repercussão nacional, ainda é cercado de contradições. Os laudos foram realizados no Departamento de Polícia Técnica (DPT), em Salvador, e confirmam também a ausência de material genético de outros três suspeitos. A análise reforça as dúvidas sobre a versão apresentada pela Polícia Civil.
“Em crimes com arma branca, é comum o autor se ferir e deixar sangue misturado com o das vítimas. Se ele confessou, deveria indicar a arma usada, mas até agora a faca não foi localizada”, observou um perito ouvido pela reportagem. O especialista destacou ainda que nenhuma das facas apresentadas pela polícia tinha digitais compatíveis com os acusados.
O crime
As vítimas — Alexsandra Oliveira Suzart, 45 anos, Maria Helena do Nascimento Bastos, 41, e sua filha Mariana Bastos da Silva, 20 — foram mortas no dia 15 de agosto, enquanto caminhavam com um cachorro pela orla. O animal foi encontrado amarrado a poucos metros dos corpos. Alexsandra e Maria Helena eram professoras da rede municipal; Mariana cursava Engenharia Ambiental.
A polícia afirma que Thierry agiu sozinho e que a motivação teria sido um assalto. Ele relatou ter rendido uma das mulheres e, diante da reação das outras duas, acabou desferindo os golpes fatais. Para peritos, a narrativa é frágil. “É improvável que apenas um homem, armado com uma faca, conseguisse dominar três vítimas sem que nenhuma delas reagisse de forma efetiva”, avalia outro especialista.
A ausência de sinais de luta corporal, como arranhões ou material genético sob as unhas das vítimas, também levanta questionamentos. Além disso, imagens de câmeras de segurança mostraram três pessoas circulando próximo ao local onde os corpos foram encontrados, mas não há confirmação de que sejam investigadas.
Contradições
Durante a audiência de custódia, Thierry declarou ter roubado R$ 30 das vítimas. Para peritos, a hipótese de latrocínio é pouco convincente: não houve subtração de bens relevantes, tampouco indícios de luta por objetos. “Latrocínios costumam ser rápidos e seguidos de fuga. Esse crime foi prolongado, cruel e sem motivo claro”, apontou um especialista.
Outro ponto que gera dúvidas é a dependência da confissão como principal elemento da acusação. “Ele é dependente químico e estava vulnerável. Confissões podem ser obtidas sob pressão. Sem provas materiais consistentes, a palavra do suspeito não se sustenta sozinha”, reforçou um perito do DPT, lembrando que a legislação brasileira não permite condenação apenas com base em confissão.
Repercussão
Familiares das vítimas ainda buscam respostas. Um parente de Alexsandra disse que a família está abalada e prefere aguardar novas informações da polícia. “Todos os dias nos perguntamos o porquê de tanta crueldade. Elas eram pessoas de bem, professoras, cuidavam de autistas. Tudo ainda é um mistério”, declarou.
A reportagem não conseguiu contato com o marido de Maria Helena, pai de Mariana.
O que diz a polícia
Em nota, a Polícia Civil informou que aguarda a conclusão dos laudos periciais antes de apresentar novos desdobramentos. A instituição destacou que Thierry segue investigado, mas reforçou que outras pessoas também estão sob apuração. “Não existem, até o momento, elementos conclusivos para afastar sua participação, e diligências continuam em sigilo”, afirma o comunicado.
O triplo homicídio, pela brutalidade e pela falta de clareza nas provas, permanece sem solução definitiva e mantém em suspense familiares e a população de Ilhéus.